O dever de informar: a relevância das Universidades Estaduais durante a pandemia 09/10/2020 - 15:43
No dia 6 de outubro o Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) publicou em seu site oficial, no setor de notícias, uma matéria intitulada “Decisão do TCE afastou risco de bloqueio de repasses de R$ 2 bilhões ao Paraná”.
O conteúdo publicado é pouco esclarecedor e leva o leitor a acreditar que as Universidades Estaduais teriam praticado atos de aumento de despesas, colocando o Estado do Paraná em risco de perder o direito de receber o auxílio do Governo Federal para o enfrentamento das consequências da pandemia.
Quanto ao Tribunal de Contas fazer seu trabalho de verificação do que lhe compete não há nada a contrapor, mas não se pode aceitar passivamente que publique “notícias” que não espelham adequadamente o trabalho feito pelo órgão.
Quem ler a notícia no site ficará com a sensação de que o TCE-PR salvou a sociedade paranaense das consequências de uma prática absurda das universidades, que teriam ampliado despesas contrariando a Lei Complementar 173/2020, lei essa que estabeleceu as condições para que Estados e Municípios pudessem se beneficiar do auxílio emergencial do Governo Federal aos entes federados.
É a lógica narrativa de preterir o dever de informar em favor do desejo de causar impacto e promover o espetáculo do herói que salva a nação das práticas corruptas dos bandidos. Isso virou moda, porque gera adesão.
É importante esclarecer os fatos. O Governo do Estado encaminhou à Assembleia Legislativa, ALEP, uma proposta de lei para regularizar as estruturas administrativas das Universidades Estaduais e seus Hospitais Universitários. Tais estruturas nunca tinham sido plenamente criadas por lei, o que configurava irregularidade. Destaque-se que o próprio TCE-PR vinha apontando tal irregularidade há bastante tempo.
A Assembleia Legislativa do Paraná aprovou por unanimidade a proposta do governo. Ressalte-se: unanimidade! Daí resultou a Lei 20.225/2020.
O TCE-PR, com o intuito de avaliar adequadamente se a referida lei gera impacto ao orçamento estadual, decidiu solicitar explicações ao Governo do Estado e, cautelarmente, em face de um processo de Tomada de Contas Extraordinária, decidiu determinar que o governo e as universidades se abstivessem de implantar o que está previsto na lei, até que se compreenda adequadamente a questão.
Foi a Superintendência Geral de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (SETI) a responsável por coordenar o processo de proposição da proposta de lei, e o fez envolvendo todas as Universidades Estaduais no debate e considerando contribuições da própria ALEP no processo.
Discussão extremamente difícil porque mexeu com a realidade das IEES redistribuindo cargos entre as instituições, provendo funções aos Hospitais Universitários e para as duas universidades mais novas (UENP e UNESPAR), uniformizando valores pagos por funções e, ainda assim, promovendo uma diminuição de 480 cargos em relação ao quantitativo anteriormente existente; gerando assim uma economia superior a R$ 16.000.000,00 (dezesseis milhões de reais), em comparação com o orçamento de 2019.
Na construção da proposta conseguimos estabelecer uma equidade entre as instituições, uniformizando padrões de cargos e remunerações, além de regularizar a atribuição do Regime de Dedicação Exclusiva para servidores que ocupam funções estratégicas. O próprio Tribunal de Contas, num acórdão de 2019, recomendou ao Governo que resolvesse definitivamente, por lei, a questão dos cargos nas universidades. É o que fizemos.
Nossas universidades desempenham um importante papel para o desenvolvimento social e econômico do Estado e, em especial no período de pandemia. Estão realizando relevante trabalho em favor da população, de modo que não é justo produzir conteúdos que induzem o cidadão a pensar que as universidades estão alheias aos problemas da pandemia e, ainda, qualificar esses conteúdos como notícias.
CORONAVÍRUS – Quero destacar as palavras do Professor Júlio Damasceno, Magnífico Reitor da Universidade Estadual de Maringá, ao tomar conhecimento da matéria divulgada no site do TCE-PR. “A única relação das universidades com a pandemia é de muito trabalho e compromisso com a população. Situar as universidades como instituições que colocaram em risco o repasse de recursos federais para o Paraná é um despropósito”.
Desde o mês de março, imediatamente após o Governo do Estado do Paraná anunciar as medidas para o enfrentamento da pandemia, as Universidades Estaduais do Paraná passaram a construir diversas soluções para enfrentar as dificuldades na área da saúde e da economia.
Desenvolveram planos de contingência e controle da propagação do vírus; produziram, em seus laboratórios, grandes quantidades de álcool em gel, máscaras escudo de proteção e outros equipamentos que foram disponibilizados gratuitamente; buscaram e receberam habilitação do Laboratório Central do Paraná para aplicar testes moleculares da Covid-19; estabeleceram parceria com a Secretaria da Saúde para ampliar, consideravelmente, o número de leitos de enfermaria e UTI nos Hospitais Universitários de Maringá, Londrina, Ponta Grossa e do Oeste do Estado; empreenderam atividades remotas em seus cursos de graduação para minimizar o prejuízo acadêmico, em consequência da suspensão das aulas presenciais; elaboraram planos de auxílio econômico e tecnológico para atender aos estudantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica; desenvolveram inúmeras pesquisas na busca da compreensão da pandemia e do seu enfrentamento; entre tantas outras ações que poderiam ser destacadas.
A mais visível das ações é, sem dúvida, o programa extensionista desenvolvido em parceria entre a Superintendência Geral de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior (SETI), a Secretaria da Saúde, a Fundação Araucária e a Itaipu Binacional que oportuniza a atuação de mais de 1.000 pessoas, entre profissionais e estudantes da área da saúde, coordenados por professores das universidades, em diferentes municípios do Paraná para enfrentar a Covid19.
Trata-se de uma ação pioneira e referência no Brasil, pois resultou na instalação de call centers e plataformas de telesaúde e telepsicologia; desenvolveu o monitoramento da entrada e saída de pessoas em barreiras sanitárias nas divisas do Estado (observe-se que mesmo situado entre São Paulo e Santa Catarina, o Paraná tem índices de incidência da COVID-19 muito inferiores aos estados vizinhos); reforçou as ações de monitoramento, prevenção e tratamento da Covid-19 com pessoas privadas de liberdade no Departamento Penitenciário do Paraná (Depen-PR); colaborou na coleta e manuseio das amostras de exames no Laboratório Central do Estado (Lacen); apoiou o trabalho do Centro de Informações Estratégicas em Vigilância em Saúde (CIEVS); apoiou o trabalho da Polícia Científica e o atendimento ao público em diversas Unidades de Pronto Atendimento (UPA) e no Complexo Hospital do Trabalhador (CHT).
Para além do trabalho diretamente com a pandemia, os pesquisadores das Universidades Estaduais desenvolveram estudos identificando aspectos estratégicos para estimular a recuperação econômica em todo o território paranaense. Tais pesquisas serviram de base para a construção da estratégia de integração Universidade/Empresa como um dos itens da Política Estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação, proposta pela Seti.
Muito se poderia dizer a respeito do papel importante e da atuação positiva da comunidade acadêmica do Paraná no contexto da pandemia. O que destacamos aqui foi apenas para fazer frente à desinformação causada com o ímpeto de gerar ‘notícias’ que privilegiam o espetáculo em detrimento do dever de informar. A atuação cuidadosa dos órgãos de controle, como o TCE-PR, é de fundamental importância para a sociedade e deve sempre ser respeitada. Os pontos de vista divergentes devem ser apresentados com o devido respeito e a adoção de verdades absolutas, deve ser sempre relativizada, por quem tem o dever de informar.
Professor Aldo Nelson Bona
Superintendente Geral de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior do Estado do Paraná.